Para que a leitura literária infantil
seja introduzida, de fato, na escola, os professores precisam entender a
importância da leitura como marco inicial do processo de inscrição da criança
no universo simbólico de sua cultura e como elemento fundamental no processo de
desenvolvimento infantil.
“A literatura infantil tem ocupado um
lugar político e pedagógico de grande importância tanto na formação ético-moral
do sujeito, como no estabelecimento de hábitos e atitudes” (BELLI, p. 75). Após
o contato com a leitura, o leitor não só adquire mais conhecimento, bem como
fica diferente do que era antes.
Através da leitura, o aluno é capaz de
exercer sua criatividade e sua autonomia, pois ela amplia a sensibilidade e a
relação do sujeito com o mundo. “Nenhum livro é bom ou ruim em si mesmo, a
experiência gerada por cada sujeito, em cada uma de suas leituras, trará um
julgamento de valor” (BELLI, p. 76).
É importante destacar, que o que se
almeja com a leitura literária não que uns saibam mais do que os outros por
terem acesso às leituras, mas sim que sejam formados pontos de vistas
diferentes a respeito de cada obra. A escola precisa criar mecanismos para que
estas obras sejam trabalhadas e que seus alunos, além de interpretá-las, saibam
fazer uso delas.
Em livros como “Sítio do Pica-PauAmarelo” de Monteiro Lobato, a intenção é formar leitores através das
experiências com o livro. A ideia de um livro onde o leitor pode morar ou fazer
parte da história, traz consigo a ideia de um livro comestível, no qual o
leitor precisa dele para se alimentar, ou seja, para construir seu
conhecimento.
A ideia de Emília, personagem do “Sítio
do Pica-Pau Amarelo”, é de que os livros sejam fabricados de maneira que possam
se comidos ao final da leitura, pois além de ser um alimento intelectual, ele
serviria também como almoço. Assim, até mesmo os analfabetos poderiam fazer uso
dos livros.
Monteiro Lobato já dizia que livros
existem para ser lidos e não para servir como obrigação para ninguém, a leitura
não deve ser imposta à criança, pois a criança precisa escolhê-la e se envolver
por ela. “Não se formam leitores obrigando-os a ler tais ou quais grandes
obras, ou entregando-lhes uma relação de livros a serem lidos durante o ano. O
que forma o leitor é aprender a escolher o que, como, por que e quando ele quer
ler. Ensinar a ler é antes de mais nada, ensinar a escolher” (BELLI, p. 79).
“Livro guardado, limpo e fechado não
serve para nada” (BELLI, p. 79). E não serve mesmo! Livros devidamente
guardados em enormes prateleiras fazem com que as crianças fiquem distantes
deles, o que os tornam inúteis. A criança precisa tocar no livro para então
criar um interesse por ele.
Vale ressaltar que a ideia de livro
comestível não significa livro descartável, pois se o livro é descartado é
porque ele foi incompleto e não causou o efeito esperado no leitor, já o livro
comestível é capaz de trazer saciedade ao seu leitor, alimentando seu corpo e
seu espírito, dando uma ideia de completude a quem ler.
“A literatura é uma forma de pensar como
a vida poderia ser, ou deveria ser, desenvolver utopias. Rompendo com as
obviedades e com as ‘realidades’, a literatura rompe com a vida já dada e
suspende a capacidade de não acreditar no que nossos olhos não vêem” (BELLI, p.
81).
É necessário que
sejam elaboradas propostas educacionais que respeite a criança e a dê possibilidade
de fazer opções, de escolher o quer ou não ler. A criança é capaz de
transformar o que não considera correta e é diferente do adulto, logo suas
demandas são diferentes. E como dizia Emília: “nós crianças precisamos mudar o
mundo; nós temos imaginação. Dos adultos, nada há de se esperar” (Histórias do
Mundo).
BELLI, Vânia. O livro comestível: a urgência de uma política social para a leitura escolar. Leitura Literária, a mediação escolar. Belo Horizonte. Faculdade de Letras da UFMG. 2004.