segunda-feira, 25 de junho de 2012

O livro comestível: a urgência de uma política social para a leitura escolar


Para que a leitura literária infantil seja introduzida, de fato, na escola, os professores precisam entender a importância da leitura como marco inicial do processo de inscrição da criança no universo simbólico de sua cultura e como elemento fundamental no processo de desenvolvimento infantil.
“A literatura infantil tem ocupado um lugar político e pedagógico de grande importância tanto na formação ético-moral do sujeito, como no estabelecimento de hábitos e atitudes” (BELLI, p. 75). Após o contato com a leitura, o leitor não só adquire mais conhecimento, bem como fica diferente do que era antes.
Através da leitura, o aluno é capaz de exercer sua criatividade e sua autonomia, pois ela amplia a sensibilidade e a relação do sujeito com o mundo. “Nenhum livro é bom ou ruim em si mesmo, a experiência gerada por cada sujeito, em cada uma de suas leituras, trará um julgamento de valor” (BELLI, p. 76).
É importante destacar, que o que se almeja com a leitura literária não que uns saibam mais do que os outros por terem acesso às leituras, mas sim que sejam formados pontos de vistas diferentes a respeito de cada obra. A escola precisa criar mecanismos para que estas obras sejam trabalhadas e que seus alunos, além de interpretá-las, saibam fazer uso delas.
Em livros como “Sítio do Pica-PauAmarelo” de Monteiro Lobato, a intenção é formar leitores através das experiências com o livro. A ideia de um livro onde o leitor pode morar ou fazer parte da história, traz consigo a ideia de um livro comestível, no qual o leitor precisa dele para se alimentar, ou seja, para construir seu conhecimento.
A ideia de Emília, personagem do “Sítio do Pica-Pau Amarelo”, é de que os livros sejam fabricados de maneira que possam se comidos ao final da leitura, pois além de ser um alimento intelectual, ele serviria também como almoço. Assim, até mesmo os analfabetos poderiam fazer uso dos livros.
Monteiro Lobato já dizia que livros existem para ser lidos e não para servir como obrigação para ninguém, a leitura não deve ser imposta à criança, pois a criança precisa escolhê-la e se envolver por ela. “Não se formam leitores obrigando-os a ler tais ou quais grandes obras, ou entregando-lhes uma relação de livros a serem lidos durante o ano. O que forma o leitor é aprender a escolher o que, como, por que e quando ele quer ler. Ensinar a ler é antes de mais nada, ensinar a escolher” (BELLI, p. 79).
“Livro guardado, limpo e fechado não serve para nada” (BELLI, p. 79). E não serve mesmo! Livros devidamente guardados em enormes prateleiras fazem com que as crianças fiquem distantes deles, o que os tornam inúteis. A criança precisa tocar no livro para então criar um interesse por ele.
Vale ressaltar que a ideia de livro comestível não significa livro descartável, pois se o livro é descartado é porque ele foi incompleto e não causou o efeito esperado no leitor, já o livro comestível é capaz de trazer saciedade ao seu leitor, alimentando seu corpo e seu espírito, dando uma ideia de completude a quem ler.
“A literatura é uma forma de pensar como a vida poderia ser, ou deveria ser, desenvolver utopias. Rompendo com as obviedades e com as ‘realidades’, a literatura rompe com a vida já dada e suspende a capacidade de não acreditar no que nossos olhos não vêem” (BELLI, p. 81).
É necessário que sejam elaboradas propostas educacionais que respeite a criança e a dê possibilidade de fazer opções, de escolher o quer ou não ler. A criança é capaz de transformar o que não considera correta e é diferente do adulto, logo suas demandas são diferentes. E como dizia Emília: “nós crianças precisamos mudar o mundo; nós temos imaginação. Dos adultos, nada há de se esperar” (Histórias do Mundo).

BELLI, Vânia. O livro comestível: a urgência de uma política social para a leitura escolar. Leitura Literária, a mediação escolar. Belo Horizonte. Faculdade de Letras da UFMG. 2004.

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